A OPA sobre a PT <br>e a última visita do Presidente da República
No dia 6 de Fevereiro à noite, investido com a fama e o proveito de ser o cidadão mais rico do país (e, relativamente, mais rico do que Bill Gates se as fortunas forem indexadas ao PIB dos respectivos países), o Engº Belmiro de Azevedo anunciou uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre a Portugal Telecom, pela qual irá disponibilizar cerca de 11 mil milhões de euros.
Este valor - difícil de pronunciar e de avaliar- equivale ao rendimento anual de 1 milhão de trabalhadores que usufruam, por ano, 11 000 euros (cerca de dois mil e duzentos contos, em moeda antiga).
«Estamos a falar de 124 milhões de euros ganhos num só dia»
O Engº. Belmiro irá «comprar» a Telecom com que dinheiro?
Com o seu? Não é possível porque nem a sua fortuna pessoal, nem os activos das suas empresas atingem tal valor.
Então com que dinheiro? Ao que os jornais dizem, com a ajuda de uma instituição financeira ligada ao grupo Santander que se disponibilizou a apoiar o negócio.
Também aqui há uma pergunta a acrescentar à pergunta anterior: O Banco Santander vai financiar a compra da PT com os seus capitais próprios? Era o que faltava! O Santander (se tudo correr de feição aos interesses da SONAE) vai permitir a compra com o dinheiro dos depositantes, o chamado «capital alheio».
Moral da história: aquele que é considerado o maior negócio de sempre em Portugal só é possível realizar porque há milhões de cidadãos anónimos que depositam as suas poupanças e os seus salários no sistema bancário (muitos deles não recebendo, não só, nenhum juro pelo saldo disponível como sendo obrigados a pagar uma comissão caso o seu saldo médio seja inferior a um limite mínimo imposto pelo banco). E é assim, com esta singeleza, que é criado aquilo que já atrás foi referido como «capital alheio» e com o qual se tecem as luvas adequadas aos dedos do capitalismo. Para se ter uma ideia do que estamos a falar basta referir que os quatro principais grupos financeiros privados (BCP, BES, BPI e Santander Totta) concederam, em 2005, um volume de crédito na ordem dos 138 mil milhões de euros, enquanto que os seus capitais próprios, reportados a 2004, orçavam cerca de 9 mil milhões de euros. Confrontemos um valor e outro e não deixaremos de concluir que a essência do negócio bancário reside na captação a custos baixos da poupança das pessoas e a sua transformação em crédito a custos diferenciados (elevados para o cidadão comum e minimizados para confrades e apaniguados).
Mas voltemos à história inicial. No dia seguinte à comunicação sobre a OPA a cotação da PT atingia, à hora de encerramento da Bolsa, os 9,69 euros por acção, ou seja mais 18,46% relativamente ao período homólogo do dia anterior (8,18 euros).
Como no dia 7 de Fevereiro foram transaccionadas 82 651 845 acções isso significou, nesta compra e venda de papel, um lucro de cerca de 124 milhões de euros.
Não, não se trata de um erro nosso. As contas estão bem feitas. Estamos a falar de 124 milhões de euros ganhos num só dia, com base nas cotações atrás referidas (o lucro pode, no entanto, ser maior em função do preço de compra das acções transaccionadas tendo em atenção os valores fixados nas cinco fases de privatização da empresa cuja privatização foi iniciada em 1995 pelo governo de Cavaco Silva).
O lucro atrás referido fundamenta-se em quê?
- Porque a nossa agricultura produziu mais legumes e frutas?
- Porque capturámos mais pescado?
- Porque transformámos mais produtos?
- Porque nesse dia exportámos mais mercadorias?
- Porque, curiosamente, também nesse mesmo dia,
de rompante, no curto espaço de 24 horas,
recebemos milhões de turistas que desataram
a comprar tudo aquilo que nós produzimos?
Eis tantas perguntas quantas as perplexidades geradas por aquilo que o PCP, muito justamente, considera de «economia de casino».
A economia onde o jogo, com cartas marcadas, faz drenar, por via da especulação, a acumulação rápida e vultuosa de capital, na razão directa dos baixos salários, das baixas reformas e prestações sociais. Se no dia seguinte ao anúncio da OPA sobre a PT houve, - sobre apenas uma empresa - uma mais-valia de 124 milhões de euros pergunta-se: quantos trabalhadores, nesse mesmo dia, foram explorados para gerar aquela drenagem de dinheiro?
A visita do Presidente da República
Enquanto decorriam os acontecimentos atrás, sumariamente, descritos, o Presidente da República dava inicio à sua última visita oficial aos 11 concelhos que ainda não havia visitado.
Que concelhos são esses e que indicadores sociais os caracterizam?
Não é nossa intenção fazer uma caracterização minuciosa. Referimos apenas quatro indicadores: o índice de poder de compra relativo a 2004, a taxa de analfabetismo reportada a 2001, o número de residentes que não dispunham de água tratada da rede pública e o número de médicos por mil habitantes.
Vejamos no Quadro anexo o que as estatísticas oficiais do INE nos dizem.
Os dados deste quadro, contemporâneos do negócio da OPA sobre a PT, constituem um libelo acusatório ao sistema que, simultaneamente, permite, no jogo da bolsa, (apenas porque uma empresa quer comprar outra empresa) um lucro, num só dia, de 124 milhões de euros. O sistema que permite isso é o mesmo que condena milhares de cidadãos a terem menos de metade da média do poder de compra do país, como são, a título meramente exemplificativo, os casos de Armamar, Cinfães, Penalva do Castelo e Tabuaço. Esse sistema é o mesmo que permite escandalosas taxas de analfabetismo, a existência de milhares de pessoas sem acesso à água potável fornecida pela rede pública, com o é caso de Cinfães, com cerca de 66% da população dela carenciada. Acresce a tudo isto a notória falta de médicos onde, na maior parte dos concelhos, não chega haver um médico por mil habitantes. Esta realidade convive temporalmente com a oferta pública de aquisição sobre a PT lançada pelo Engº. Belmiro de Azevedo e com a especulação financeira a ela associada, geradora de fabulosos lucros sem que a economia real os fundamente. O Presidente da Republica conhece o antagonismo destas duas realidades que não se compaginam com a letra e o espírito da Constituição. Por isso, não obstante ter já encerrado o acto eleitoral destinado a eleger o novo Presidente da República, continua na ordem do dia a exigência de uma ruptura democrática que faça respeitar os quatro alicerces da democracia: a política, a económica, a social e a cultural.
Com o seu? Não é possível porque nem a sua fortuna pessoal, nem os activos das suas empresas atingem tal valor.
Então com que dinheiro? Ao que os jornais dizem, com a ajuda de uma instituição financeira ligada ao grupo Santander que se disponibilizou a apoiar o negócio.
Também aqui há uma pergunta a acrescentar à pergunta anterior: O Banco Santander vai financiar a compra da PT com os seus capitais próprios? Era o que faltava! O Santander (se tudo correr de feição aos interesses da SONAE) vai permitir a compra com o dinheiro dos depositantes, o chamado «capital alheio».
Moral da história: aquele que é considerado o maior negócio de sempre em Portugal só é possível realizar porque há milhões de cidadãos anónimos que depositam as suas poupanças e os seus salários no sistema bancário (muitos deles não recebendo, não só, nenhum juro pelo saldo disponível como sendo obrigados a pagar uma comissão caso o seu saldo médio seja inferior a um limite mínimo imposto pelo banco). E é assim, com esta singeleza, que é criado aquilo que já atrás foi referido como «capital alheio» e com o qual se tecem as luvas adequadas aos dedos do capitalismo. Para se ter uma ideia do que estamos a falar basta referir que os quatro principais grupos financeiros privados (BCP, BES, BPI e Santander Totta) concederam, em 2005, um volume de crédito na ordem dos 138 mil milhões de euros, enquanto que os seus capitais próprios, reportados a 2004, orçavam cerca de 9 mil milhões de euros. Confrontemos um valor e outro e não deixaremos de concluir que a essência do negócio bancário reside na captação a custos baixos da poupança das pessoas e a sua transformação em crédito a custos diferenciados (elevados para o cidadão comum e minimizados para confrades e apaniguados).
Mas voltemos à história inicial. No dia seguinte à comunicação sobre a OPA a cotação da PT atingia, à hora de encerramento da Bolsa, os 9,69 euros por acção, ou seja mais 18,46% relativamente ao período homólogo do dia anterior (8,18 euros).
Como no dia 7 de Fevereiro foram transaccionadas 82 651 845 acções isso significou, nesta compra e venda de papel, um lucro de cerca de 124 milhões de euros.
Não, não se trata de um erro nosso. As contas estão bem feitas. Estamos a falar de 124 milhões de euros ganhos num só dia, com base nas cotações atrás referidas (o lucro pode, no entanto, ser maior em função do preço de compra das acções transaccionadas tendo em atenção os valores fixados nas cinco fases de privatização da empresa cuja privatização foi iniciada em 1995 pelo governo de Cavaco Silva).
O lucro atrás referido fundamenta-se em quê?
- Porque a nossa agricultura produziu mais legumes e frutas?
- Porque capturámos mais pescado?
- Porque transformámos mais produtos?
- Porque nesse dia exportámos mais mercadorias?
- Porque, curiosamente, também nesse mesmo dia,
de rompante, no curto espaço de 24 horas,
recebemos milhões de turistas que desataram
a comprar tudo aquilo que nós produzimos?
Eis tantas perguntas quantas as perplexidades geradas por aquilo que o PCP, muito justamente, considera de «economia de casino».
A economia onde o jogo, com cartas marcadas, faz drenar, por via da especulação, a acumulação rápida e vultuosa de capital, na razão directa dos baixos salários, das baixas reformas e prestações sociais. Se no dia seguinte ao anúncio da OPA sobre a PT houve, - sobre apenas uma empresa - uma mais-valia de 124 milhões de euros pergunta-se: quantos trabalhadores, nesse mesmo dia, foram explorados para gerar aquela drenagem de dinheiro?
A visita do Presidente da República
Enquanto decorriam os acontecimentos atrás, sumariamente, descritos, o Presidente da República dava inicio à sua última visita oficial aos 11 concelhos que ainda não havia visitado.
Que concelhos são esses e que indicadores sociais os caracterizam?
Não é nossa intenção fazer uma caracterização minuciosa. Referimos apenas quatro indicadores: o índice de poder de compra relativo a 2004, a taxa de analfabetismo reportada a 2001, o número de residentes que não dispunham de água tratada da rede pública e o número de médicos por mil habitantes.
Vejamos no Quadro anexo o que as estatísticas oficiais do INE nos dizem.
Os dados deste quadro, contemporâneos do negócio da OPA sobre a PT, constituem um libelo acusatório ao sistema que, simultaneamente, permite, no jogo da bolsa, (apenas porque uma empresa quer comprar outra empresa) um lucro, num só dia, de 124 milhões de euros. O sistema que permite isso é o mesmo que condena milhares de cidadãos a terem menos de metade da média do poder de compra do país, como são, a título meramente exemplificativo, os casos de Armamar, Cinfães, Penalva do Castelo e Tabuaço. Esse sistema é o mesmo que permite escandalosas taxas de analfabetismo, a existência de milhares de pessoas sem acesso à água potável fornecida pela rede pública, com o é caso de Cinfães, com cerca de 66% da população dela carenciada. Acresce a tudo isto a notória falta de médicos onde, na maior parte dos concelhos, não chega haver um médico por mil habitantes. Esta realidade convive temporalmente com a oferta pública de aquisição sobre a PT lançada pelo Engº. Belmiro de Azevedo e com a especulação financeira a ela associada, geradora de fabulosos lucros sem que a economia real os fundamente. O Presidente da Republica conhece o antagonismo destas duas realidades que não se compaginam com a letra e o espírito da Constituição. Por isso, não obstante ter já encerrado o acto eleitoral destinado a eleger o novo Presidente da República, continua na ordem do dia a exigência de uma ruptura democrática que faça respeitar os quatro alicerces da democracia: a política, a económica, a social e a cultural.